quarta-feira, abril 19, 2006

A PELOTA in Os Gerais

Começou o desespero.

Deu início a agonia.

Toque de chapa na angústia...


Um sol fraco, mal raiado, vergonhoso, embrenhado em nuvens, foi cúmplice do redemoinho que surgiu por entre a massa concreta dos ladrilhos do chão do quarto onde eu insoniava. Do meio da fumaça giratória chegou-se o risonho, espírito bonachão que só, trambiqueiro das palavras, pregador de peças e desafios e adivinhas, fasmisgerado... faz-me-gerado... falmisgeraldo... familhas-gerado... o Famigerado, ele, o João, o Guimarães, o Rosa... O diabo.

Direto do quente do sertão, tinha saltado cedo da tumba pra me ferrar os ossos, me por calafrios, medos, arrepios. Rindo, sem conversa, gargalhando, vendo duendes amarelos pelos óculos de garrafa, disse que ia acompanhar de perto, com visores, as primeiras histórias do certame dos índios, dos pretos, dos brancos, dos mulatos, dos brasileiros... E não havia jeito de desdizer pessoa saída de tornado miúdo.

Queria minha carona, prum passeio e o retorno, e se infiltrou na mochila, junto da limonada, da torta de bananas, enquanto eu viajava no tempo, através do espaço, pro sul, e pela bússola, passando pelos campos, pelos matos, pelas veredas... A sagarana inteirona. O sábado e o domingo. Porque era estréia, o porvir da sofreguidão, as gentes toda de sentidos em pé. As margens da alegria, o pirlimpsiquice... O espelho antes das fatalidades...

Mas em busca de barbantes barulhentos, seguimos caravana pelo Arruda, Canindé, Ressacada, Machadão, Castelão, Mané Garrincha, Brinco de Ouro, Baenão, Morumbi, Olímpico, Serra Dourada, Arena, Maracanã, Parque Antártica e doutros nomes... Fomos vislumbrando os sapos das tradições, enterrados no vestiário dos que visitam... Vimos os uniformes acumulando climas... Os cruzamentos zunindo no céu... As tabelas se pintando nos vastos... E tiros a gol, nos postes, nos vazios, nos arqueiros, nas corujas...

Porém os zeros no placar, em desagrado, desentendidos: Goiás e Santos, Santa Cruz e Figueirense, fizeram o Judas da rodada, desempenharam a traição sem beijo, sem abraço, sem vibro. No entanto, sem culpa. Pois foi debaixo das traves que Dito e Diadorim resolveram brincar de feitiço e impediram que a bola passasse pela linha do crime. E esbugalharam a nueza das vistas de Miguilim! E eriçaram as tranças da Menina de Lá! E atrasaram os ponteiros do relógio de Augusto Matraga! E quando Rosa, o doutor-jagunço da seca, percebeu a calhorda, já viviam-se os acréscimos... E o tempo era só vento, refazendo-se em novo redemoinho, tragando os fantasmas para o além, os personagens todos, os atores, os brincalhões... Incluindo o Famigerado, que tentou escapar na barcaça do Audaz Navegante.

Tantos caminhos a percorrer, percorridos. No bumbar da barriga dos bois, se acabam os apitos, os fôlegos; e os refletores do outono se apagam, em silêncio, como as luzes dos vaga-lumes...

Nas trilhas, o cabisbaixismo dos infelizes derrotados, as danças dos vencedores temporários, e os incertos... Destinos lançados às correntes, e a vida em flor, por milagres, fábulas e ilusionismos...

Os Gerais São Os Gerais: 40 corações disputarão até o início de dezembro 760 entraves. A tônica é simples, e como a teoria da simplicidade, cruel: dos 40 órgãos, 15 obterão alguma alegria, 17 ficarão na entressafra, e 8 sonharão com pesadelos. Aparentemente os números são favoráveis, mas as aparências enganam. Sem citar prejuízos históricos, morais, e financeiros, é a faca de um verso: “tristeza não tem fim, felicidade sim”.

Enviado por Rufus Melancólico